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08 julho 2011

I Mostra Cinema Poções é dedicada ao cineasta Tuna Espinheira




O velho Tuna Espinheira passou sua infância vendo filmes em Poções. Ainda em terna idade, quando ainda não tinha barba, e não usava o seu indefectível boné, pelas mãos de seu pai, Dr. Rui Espinheira, respeitado advogado, tinha cadeira cativa no principal cinema de Poções. Cinquenta anos depois, já feito cineasta renomado, volta a Poções para ser o homenageado da primeira mostra de cinema dessa cidade do interior da Bahia. Transcrevo aqui o release que me foi enviado:

"Entre os dias 5 e 7 de agosto o Cineclube Tela em Transe realiza na Câmara de Vereadores de Poções  a I Mostra Cinema Poções, dedicada ao cineasta Tuna Espinheira. Com o objetivo de promover um estímulo à arte cinematográfica na cidade e região, durante três dias a programação da Mostra terá filmes do homenageado, mesa redonda, oficinas e também apresentações musicais e exposição.

O cineasta Tuna Espinheira passou sua infância em Poções e volta à cidade depois de 50 anos para receber esta homenagem. Com mais de 30 trabalhos, como ator, editor, roteirista, produtor e diretor, em 40 anos de atuação no cinema baiano, Tuna Espinheira terá quatro de suas obras exibidas durante a Mostra. Para abrir o evento, será exibido o filme 2 de Julho, Viva a Independência da Bahia. No sábado (6) o público poderá acompanhar o longa metragem Cascalho, lançado em 2004, e no último dia da Mostra, dois curtas serão exibidos: Leonel Matos, 24 Quadros por Segundo e O Bruxo Bel Borba.

Além da homenagem ao cineasta e exibição dos seus filmes, a Mostra vai promover uma mesa redonda sobre o cinema baiano, com o crítico de cinema e professor da Facom (Ufba) André Setaro, e sobre cinema independente, com o cineastas  local, Valdeson Ferreira Souza, e oficina de roteiro, com o jornalista e estudioso em cinema Glauber Lacerda. As inscrições para a mesa redonda e para as oficinas serão divulgadas em breve e vão poder ser feitas pelo endereço eletrônico http://www.cinetelaemtranse.blogspot.com de forma gratuita, mas haverá limite de vagas.

Durante a I Mostra Cinema Poções, o fotógrafo Carlos Rizério realiza uma exposição em que mistura a realidade das cidades de Poções e Vitória da Conquista com a poesia dos cartazes cinematográficos dos filmes do século passado em 12 cartazes. O músico Chico Schettini também se apresenta na primeira noite da Mostra e uma apresentação da Filarmônica 26 de Junho encerra o evento."

06 julho 2011

"O Grito Krajcberg" - Trailer

"O Grito Krajcberg", de Renata Rocha

O Grito Krajcberg, de Renata Rocha, é um documentário que percorre a vida e a obra de Frans Krajcberg e que tem sua avant-première amanhã, dia 7 de julho, às 19 horas, no Espaço Unibanco Glauber Rocha. Para dar uma ideia da importância de Krajcberg, transcrevo, aqui, o que li na Wikipédia sobre o artista:

Frans Krajcberg (Kozienice12 de abril de 1921) é um pintorescultorgravador efotógrafoartista plástico nascido na Polônia e naturalizado brasileiro.
Em 2008, recebeu o grande prêmio da APCA.
Durante a Segunda Guerra Mundial (1938-1945) em 1939, Krajcberg buscou refúgio na União Européia, onde estudou engenharia e artes na Universidade de Intgrad. Residiu na Alemanhaprosseguindo seus estudos na Academia de Belas Artes de Stuttgart.

Chegou ao Brasil em 1948, vindo a participar da oitava Bienal de São Paulo, em 1951. Durante a década de 1940 o seu trabalho era abstrato.
De 1948 a 1954 viveu entre as cidades de ParisIbiza e Rio de Janeiro, onde produziu os seus primeiros trabalhos fruto do contato direto com a natureza. Na década de 1950 morou em uma caverna no Pico da Cata Branca, região de Itabirito, no interior de Minas Gerais. Ali na região, à época, era conhecido como o barbudo das pedras, uma vez que vivia solitário, sem conforto, tomando banho no rio vizinho, enquanto produzia, incessantemente, gravuras e esculturas em pedra.
Em 1964, executou as suas primeiras esculturas com madeiras de cedros mortas. Realizou diversas viagens à Amazônia e ao Pantanal Matogrossense, fotografando e documentando os desmatamentos, além de recolher materiais para as suas obras, como raízes e troncos calcinados. Na década de 1970 ganhou projeção internacional com as suas esculturas de madeira calcinada.
A sua obra reflete a paisagem brasileira, em particular a floresta amazônica, e a sua constante preocupação com a preservação do meio-ambiente. Atualmente, o artista tem se dedicado à fotografia.

O Sítio Natura



Krajcberg está radicado desde 1972 no sul da Bahia, onde mantém o seu ateliê no Sítio Natura, no município de Nova Viçosa. Chegou ali o convite do amigo e arquiteto Zanine Caldas, que o ajudou a construir a habitação: uma casa, a sete metros do chão, no alto de um tronco depequi com 2,60 metros de diâmetro. À época Zanine sonhava em transformar Nova Viçosa em uma capital cultural e a sua utopia chegou a reunir nomes como os de Chico BuarqueOscar Niemeyer e Dorival Caymmi
.


No sítio, uma área de 1,2 km², um resquício de Mata Atlântica e de manguezal, o artista plantou mais de dez mil mudas de espécies nativas. O litoral do município é procurado, anualmente, no inverno, por baleias-jubarte. No sítio, dois pavilhões projetados pelo arquitetoJaime Cupertino, abrigam atualmente mais de trezentas obras do artista. Futuramente, com mais cinco construções projetadas, ali se constituirá o Museu que levará o nome do artista.

Ativismo ecológico

denunciou queimadas no estado do Paraná;
Ao longo de sua carreira, o artista:
  • denunciou a exploração de minérios no estado de Minas Gerais;
  • denunciou o desmatamento da Amazônia brasileira;
  • defendeu as tartarugas marinhas que buscam o litoral do município de Nova Viçosa para desova;
  • postou-se na frente de um trator para evitar a abertura de uma avenida na cidade de Nova Viçosa.

05 julho 2011

Nós que nos amávamos tanto


Obra-prima de Ettore Scola, Nós que nos amávamos tanto (C'eravamo tanto amati, 1974), espelho de uma época, é um filme fascinante, que retrata a história italiana após a Segunda Guerra Mundial como, também, faz uma reflexão sobre o próprio cinema que se realizou no período que vai do fim do conflito aos começos dos anos 70. Acompanha a trajetória de três homens que se fizeram amigos durante a luta bélica e, finda esta, cada um segue o seu caminho, a sua trajetória. Um é operário, que trabalha num hospital, Nino Manfredi, o outro é um intelectual, Steffano Satta Rosa, e o terceiro um advogado em início de carreira, Vittorio Gassmann, o único que consegue ascender, pela ambição, na escala social. Em torno deles, Luciana (Stefania Sandrelli, belíssima), amada por todos, que, primeira namorada de Manfredi, vem a conhecer Gassman e, depois, também tem um caso com Rosa, o crítico cinematográfico.
Scola trabalha com singular expressividade o tempo cinematográfico, e é criativo nas situações estabelecidas, em particular a repetição que faz, em momento belo e comovente, dos recursos teatrais da época, vistos pelo casal Manfredi/Sandrelli, quando, num momento em que o personagem está a pensar, tornam-se imóveis. Na saída do teatro, Sandrelli tenta explicar a Manfredi o que significa aquela imobilidade e pede a ele que diga um pensamento secreto. E ele diz a ela que a ama. Os dois ficam imóveis. O tempo de aprender a viver. No meio do filme, na transição do preto e branco para o colorido, a passagem do tempo é explicitada num plano geral de uma praça romana, que vai se aproximando para um desenho que um homem faz no seu chão e que, aos poucos, vai se colorindo. A ascensão da cor da textura do celulóide como um elemento funcional de significação. No final, quando Gassmann está com os amigos no Meia Porção, reunidos no outono da vida, ele pensa, num lance de memória resnaisiano, na possibilidade dele ter morrido na guerra. O flash-back, aqui, por uma projeção de um pensamento irreal, se faz em sépia, ao passo que, no princípio, os episídios da guerra são em preto e branco. Poder-se-ia dizer mesmo que o tempo é um personagem importante em Nós que nos amávamos tanto. Dilacerante o dialógo final, quando Gassmann encontra Luciana, que amou a vida toda e, por ter se casado com a filha de um empresário milionário, perdeu-a para sempre. Aliás, magnífico o Aldo Fabrizi no papel desse magnata, gordo, deseducado, arrotante, deslumbrante. Para Scola, a comicidade pela comicidade não faz sentido. Sempre deve haver, nela, um tom satírico, um tom irônico. Veja a seqüência da inauguração de uma obra na qual é servido um porco au grand complet, e os comensais, vistos em close ups, parecem se assemelhar, na grossura, na enormidade dos gestos e de suas gorduras, ao pobre animal que descansa sobre a bandeja a ser estraçalhado pela gula.
Filme que tem a cinefilia como elemento catalisador, C'eravamo tanto amati revela bem o esprit du temps. A cinefilia, por exemplo, perdeu o seu status político e, segundo José Carlos Avellar está morta. Perguntado por que parou de escrever, o crítico disse que uma de suas razões estava no desaparecimento da cinefilia. E, realmente, não existe mais uma cinefilia que tem um grande representante em Nicola, personagem de Stefanno Satta Flores em Nós que nos amávamos tanto. Sempre embebido pelo humor e poesia, o filme de Ettore Scola envolve e comove. Há certas transferências criadoras, como no já citado diálogo entre Mandredi e Sandrelli depois do teatro, que se poderia acrescentar quando, retornando aos braços da amada, toma conta de seu filho (dela) numa sala de exibição enquanto ela trabalha de lanterninha. Na tela, está sendo exibidaServidão humana (Of human bondage, 1965), de Ken Hughes, e o que se apresenta é uma conversa amorosa entre Laurence Harvey e Kim Novak. Scola troca o diálogo dos dois para transferi-lo para o que Manfredi pensa enquanto assiste ao filme, como se estes fossem ele e Sandrelli num momento de amor.
Alguns dados sobre Ettore Scola:
Cineasta italiano (10/5/1931-). Nasce em Trevico, na Campânia, e muda-se mais tarde para Roma. Inicia um curso de direito, mas não chega a se graduar. Dedica-se ao jornalismo e trabalha como diagramador de um periódico humorístico. É bom de ver que nos anos 50 e 60 o cinema italiano podia ser considerado como um dos melhores do mundo, havendo mestres da comediografia que nunca foram superados até hoje (Dino Risi, Mario Monicelli, Steno, Pietro Germi...).
Depois é contratado por roteiristas para escrever piadas para o cinema e, gradualmente, passa a atuar como diretor. Ligado ao Partido Comunista Italiano (PCI), tem suas obras marcadas pela temática social e política.
Torna-se conhecido com Ciúme à Italiana (1970), satírico, político, que o faz partidário da grande fase da comediografia de seu país. Fica internacionalmente famoso com Nós Que Nos Amávamos Tanto (1974), que mostra a amizade entre três homens apaixonados pela mesma mulher, e Feios, Sujos e Malvados (1975), sobre o patriarca de uma numerosa família que vive apertada em um barraco nos arredores de Roma. Complôs, traições e incesto são apenas alguns dos ingredientes que compõem sua crítica à desigualdade.
Um Dia Muito Especial (1977), estrelado por Sophia Loren e Marcello Mastroiani, é considerado de rara delicadeza e sensibilidade. Filma ainda Casanova e a Revolução (1982), O Baile (1983), A Família (1986), Maccaroni (1985), A Viagem do Capitão Tornado (1990), A História de um Jovem Pobre (1995), Mario, Maria e Mario (1994) e La Cena (O Jantar, 1998).

03 julho 2011

A permanência de "Ladri di biciclette"


Muito mais do que uma data comemorativa, os 63 anos de Ladrões de bicicleta (Ladri di biciclette, 1948), que se completam neste 2011, refletem a dimensão temporal de um marco do neorrealismo italiano que modificou profundamente a maneira de se fazer cinema.
Sobre ser um filme que ultrapassa o documento de uma época, para se revelar um monumento divisor-de-água do cinema moderno, pleno de um humanismo desaparecido da cinematografia contemporânea, esta obra de autoria de Vittorio DeSica (diretor) e Cesare Zavattini (roteirista) oferece à história do cinema não somente uma evolução como também, e principalmente, um modelo que iria influenciar sobremaneira toda a geração de realizadores posteriores.
Talvez o Cinema Novo não existisse sem o neorrealismo italiano, assim como o Free Cinema inglês e outras manifestações referentes a uma nova postura diante da realidade, uma inédita representação do real. O neorrealismo tem tanta força que influencia até os dias atuais o cinema no mundo (a maioria dos filmes que se faz no Irã que outra característica tem senão o forte acento neo-realista?).
Por outro lado, é verdade que o ponto de partida neo-realista (sem falar dos seus precursores) é Roma, cidade aberta (Roma, città aperta), de Roberto Rossellini, que data de 1945. Esta obra, de um mestre renovador (que instaurou, nos anos 50, ao lado de Michelangelo Antonioni, a desdramatização e a liberdade em relação ao roteiro de ferro), não possui, entretanto, com o passar dos anos, a mesma atualidade, a mesma envolvência, o mesmo espanto que ainda causa, nos dias de hoje, Ladri di biciclette. Roma, città aperta é um grande filme, um momento de extrema urgência para o realismo cinematográfico, mas um filme circunscrito aos fatos da época ou, numa palavra, datado.
O neo-realismo (termo criado pelo esteta Umberto Barbaro) caracteriza um cinema que procura focalizar a realidade de um momento histórico, qual sejam as condições de vida na Itália logo após o término da Segunda Guerra Mundial. Na década de 40, o cinema era Hollywood, o "star-system" (o sistema de astros e estrelas), o "system-studio" (o sistema de estúdios), com o predomínio do cinema de gênero e os filmes todos feitos nos interiores dos estúdios.
Nos postulados de Zavattini, havia a necessidade de os realizadores cinematográficos abordarem a realidade in loco sem enfeites, com as filmagens nas ruas, na cidade. Seu manifesto do descer às ruas é eloqüente nesse sentido, além de, também, procurar dar ênfase ao humanismo. A utilização de atores não-profissionais tinha a função de desglamurizar o espetáculo cinematográfico.
Do interior hollywoodiano, passava-se ao exterior das ruas de Roma, e, por extensão, das ruas de todas as cidades cujos cineastas apostaram na concepção neorrealista do cinema. A influência desta vai até ao cinema de Hitchcock (cineasta, por excelência, de estúdio), que, com O homem errado (The wrong man), filmado em Nova York, adere, ainda que por pouco tempo e por um único filme, à necessidade de representar o homem no seu habitat natural.
Claude Beylie, exegeta francês, disse que Ladri di biciclette é uma parábola sobre a solidariedade humana, chegando a compará-lo a uma obra-prima inconteste do cinema: Em busca do ouro (The gold rush, 1925), de Charles Chaplin. E disse mais sobre este filme sessentão: "Sob a máscara da constatação objetiva de um país arruinado pela guerra, Ladrões de bicicleta, como, mais tarde, Milagre em Milão (1951) e Umberto D (1952) - todos de DeSica, denuncia, na verdade, a impotência das instituições para resolverem dignamente os dramas do proletariado".
Ettore Scola, em 1974, com seu poético Nós que nos amávamos tanto (C'eravamo tanto amanti!) faz alusão a este filme de Vittorio DeSica através de um crítico de cinema que o tem como um de seus filmes preferidos e chega, inclusive, a participar de um programa de televisão para responder sobre o método que o diretor empregou para fazer o filho do operário, Enzo Staiola, chorar. A sua resposta, porém, não o faz vencedor, mas anos mais tarde, vem assistir ao próprio DeSica (em sua última aparição nas telas) contar como fez para extrair a emoção de seu pequeno personagem.
Em Roma, um operário desempregado (Lamberto Maggiorani) consegue um emprego para o qual é preciso possuir uma bicicleta. Para consegui-la, sua mulher penhora seus bens domésticos, mas logo no primeiro dia do trabalho a bicicleta lhe é roubada. O filme é a história da busca do veículo até que, ao constatar que este é praticamente irrecuperável, o operário decide, por sua vez, roubar uma bicicleta em dia de muita agitação às portas de um estádio de futebol. Mas é surpreendido e recriminado por seu filho, com o qual, lado a lado, efetuou a procura de seu instrumento de trabalho.
Há, evidente, e ao contrário do esquema narrativo in crescendo hollywwodiano, uma certa desdramatização do tema, com os atores e cenários naturais, inseridos num contexto social determinado. A busca é um pretexto para a exposição das mazelas deixadas pela guerra recém-findada. O que faz de Ladri di biciclette uma obra tão expressiva e de impressionante atualidade é que os personagens são seres vivos (atualmente na maioria dos filmes oriundos da industrial cultural de Hollywood os personagens são títeres e meros condutores da ação). E a cenografia está eleita por um critério tal que transcende o mero naturalismo para se converter em verdadeiro elemento expressivo.